- Não esquecemos, e já lá vão séculos, que D. Afonso bateu na mãe, recordamos, a toda a hora, as prepotências de Salazar, de há décadas, mas olvidámos já que, bem recentemente, há pouco mais de um ano, se fechou um ciclo de seis anos de política de criminoso esbanjamento e de negócios públicos pouco transparentes, com que Sócrates e os seus homens de mão asfixiaram as Finanças e a Economia deste País, deixando-nos de mão estendida e à mercê de entidades credoras estrangeiras.
- Manifestamos (e insultamos) nas ruas o nosso repúdio pelas medidas do actual carrasco e esquecemos e perdoamos a quem nos mandou para este cadafalso.
- Exigimos reformas, um novo rumo para o País, mas insurgimo-nos sempre que os actuais mandantes tentam mexer com a (des)ordem estabelecida ou acabar com vícios instituídos.
- Clamamos, de há muito, que, a nível salarial, somos uma Sociedade desigual e desequilibrada, em que os exorbitantes salários de alguns são uma ofensa gritante aos baixos vencimentos dos trabalhadores menos afortunados, mas colocamo-nos ao lado dos primeiros - e batemos palmas às suas manifestações - sempre que quem governa ousa cortar-lhes regalias exageradas.
- Lamentamos, sofridos, das medidas duras que nos cerceiam a bolsa, condenamos os défices astronómicos e os excessivos gastos das empresas do sector público e, por via disso, e justamente, do encerramento de estruturas de carácter social, mas aceitamos e comungamos das lutas empreendidas por grupos de melhor estatuto económico sempre que se manifestam na ruas e nos privam de transportes e cuidados médicos.
- Queremos mudanças na Justiça, o fim da corrupção e do compadrio, mas silenciamos quando a principal oposição no Parlamento exulta e aplaude o chumbo do "enriquecimento ilícito" no Tribunal Constitucional.
- Andámos anos a clamar pela extinção dos Governos Civis, os tais comissariados dos partidos no poder nos distritos, mas nunca viemos a público rejubilar quando se deu esse passo.
- Somos um Povo que se tem em boa conta nos critérios de inteligência e, no dizer de muitos, desconfiado, mas, tal como nos produtos publicitados e nas crendices televisivas, que corremos a comprar, fazemos eco e diapasão das balelas e retóricas gratuitas e propagandistas dos habituais e residentes vendedores da banha da corda partidária que nos manipulam por detrás do ecrã e nas grandes parangonas dos tablóides.
- Julgamo-nos atentos, avisados, honestos e fiéis aos compromissos assumidos e andamos de boca cheia apregoando que somos diferentes dos gregos, mas é para as calendas gregas que despejamos esses valores, quando nos iludimos com a demagogia barata e pelo populismo fácil, que nos é acenada por alienados e iluminados do "quanto pior melhor", para que sejamos mais uma Grécia, nesta Europa que eles sempre renegaram.
- Pugnamos, desde sempre, por uma Educação e preparação para a vida activa dos nossos jovens mais eficaz, mas rebelamo-nos contra todas as medidas que impliquem mais exames e exigências no Ensino e, se calámos quando se encerraram escolas do Interior e obrigaram os nossos filhos a serem diariamente despejados em armazéns escolares, ora tomamos as dores do professorado que teme pela perda de lugares, em resultado das "madrassas" então gizadas e construídas.
- Irritamo-nos, com toda a razão, contra canudos universitários atribuídos com facilitismos de vária natureza, como no caso dum Ministro, mas não compreendemos o que leva algumas Ordens Profissionais a dificultarem o acesso ao seu seio de licenciados do "Bolonha", que concede diplomas num tempo de ensino tão breve como o tempo gasto dum burro a comer fardo de palha.
- Zangamo-nos com os autarcas por não terem verbas disponíveis para a manutenção das escolas do 1º Ciclo, não zelarem pela conservação das vias municipais, mas somos os mesmos que aplaudimos e tecemos loas aos responsáveis dos municípios quando vimos crescerem pavilhões desportivos e piscinas como cogumelos, ora de portas abertas às moscas, que falta gente e dinheiro para a sua manutenção.
- Queremos, em suma, que Portugal mude e se regenere, em nome das gerações vindouras, mas gritamos por delongas e mais dívida futura e fazemos finca-pé para que tudo fique na mesma.
Afinal, nós somos assim, o Povo que sempre fomos: queremos sol na eira e chuva no nabal!