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sexta-feira, 1 de março de 2019

VOUZELA E O DECEPADO



Assinalam-se os 543 anos da Batalha de Toro, em que sobressaiu a coragem e o amor pátrio de D. Duarte de Almeida, o Decepado.
Completa e interessante a abordagem aos factos e à figura desta figura, que é um dos símbolos e orgulho de Vouzela, no texto que a seguir transcrevo, de autoria de Vouzelar-Associação de Promoção de Vouzela.
Com a devida vénia:

"O decepado de Vouzela – D. Duarte de Almeida
Assinalam-se, hoje, 543 anos sobre a Batalha de Toro, evento que eternizou D. Duarte de Almeida, também conhecido como o decepado.
Conheça esta figura histórica ligada a Vouzela, o seu extraordinário ato de valentia e confira os factos que separam a lenda da realidade.
Volvidos mais de 500 anos sobre a vida de D. Duarte de Almeida muito detalhes se perderam no tempo.
Julga-se que as suas ligações a Vilharigues remontam ao seu bisavô, D. João Fernandes de Almeida, fidalgo no reinado de D. Afonso III (1248-1279), Senhor da casa da cavalaria de Vouzela e do castelo de Vilharigues, cujos títulos passaram de geração em geração.
Encontra-se devidamente documentado que durante o reinado D. Afonso V, entre 1438 e 1481, Duarte de Almeida desempenhava funções no exército.
Uns, indicam-no como alferes-mor do rei (um alto cargo oficial, a quem competia a função de carregar o estandarte de Portugal no campo de batalha e de desempenhar funções de comandante-chefe) enquanto outros dizem que foi apenas o substituto do alferes-mor na Batalha de Toro.
Seja de uma forma ou de outra, tais detalhes em nada alteram a bravura e a espetacularidade da história que se segue.
Corria o ano de 1475 quando o rei de Castela morreu.
Tal facto atirou o reino para uma profunda crise dinástica que colocou em confronto: Joana de Trastâmara (que se acreditava ser filha bastarda do rei) e D. Isabel I, cujos apoiantes eram, respetivamente, os joanistas e os isabelinos.
Em portugal, o rei D. Afonso V, tinha prometido ao falecido rei de Castela proteger os interesses de D. Joana de Trastâmara, sua sobrinha. Aliás, tão convicto estava que chegou mesmo a casar com ela, assumindo claramente as suas pretensões em defender os interesses desta e, consequentemente, em unir os tronos de Portugal e de Castela.
D. Joana tornou-se assim rainha consorte de Portugal.
No entanto,o casamento não se mostrou suficiente para garantir o acesso à coroa, pelo que, em fevereiro de 1476, o rei Português decidiu invadir Castela.
Alguns dias mais tarde, a 1 de março de 1476, deu-se um confronto bélico que ficou conhecido por Batalha de Toro (cidade na margem norte do rio Douro, perto da cidade de Zamora).
No meio de um inverno rigoroso e de um período de fome, o cerco a Zamora não correu bem e as tropas Portuguesas que foram obrigadas a retirar, apesar de se encontrarem representadas em maior número.
A escassos cinco quilómetros da cidade de Toro, no inicio da noite chuvosa de 1 de março, as tropas rivais digladiaram-se.
Duarte de Almeida, desempenhando as funções de alferes-mor, encabeçou as tropa, montado a seu cavalo, segurando o pendão nacional com a mão esquerda e a espada com a mão direita.
Perseguido pelos inimigos, ergueu a bandeira portuguesa, defendendo a pátria com heróica bravura, quando, com uma violenta cutilada, o inimigo lhe cortou a mão esquerda.
Agonizando de dor, segurou então a bandeira com a mão direita, que lhe foi também decepada.
Desesperado, tomou o estandarte com os dentes e resistiu até cair moribundo.
Várias crónicas Castelhanas dos séc.s XVII e XVIII referem esta figura histórica e a Batalha de Toro. Fernando Denis, historiador do séc.XIX, na obra "Historia de Portugal", defende mesmo que Duarte de Almeida foi deixado à sua sorte pelos compatriotas que partiram em retirada. Escreveu: "Llevaba la bandera real Duarte de Almeida que, en lo más recio de la batalla, se vio abandonado por los suyos".
Ricardo González Padierna, na obra "Toro", afirma: "Duarte, al ver ya el trágico desenlace, se quedó plantado en el lugar, luchando espada en mano y chorreándole la sangre de los castellanos por el codo del brazo con el que repartía los mandobles".
Na realidade, nenhuma das partes saiu oficialmente vencedora da Batalha de Toro mas, do ponto de vista estratégico, ficou claro que o rei de Portugal não tinha condições para garantir o direito da princesa Joana à coroa de Castela.
Pouco tempo depois, vitima de uma depressão, D. Afonso V abdicou da coroa para o seu filho, D. João II - O Príncipe Perfeito.
A maior parte dos autores Castelhanos defende que Duarte de Almeida padeceu no campo de batalha ou que foi feito prisioneiro e nunca mais voltou a Portugal.
Contudo, a posição histórica dominante afirma que Duarte de Almeida foi conduzido, já semimorto, para um acampamento inimigo, onde recebeu os primeiros curativos, e mais tarde foi mandado para um hospital de Castela.
Aventa-se que, ao fim de muitos meses, voltou a Vilharigues, onde o esperavam a mulher e os dois filhos, Rui e Afonso de Almeida.
Alguns cronista defendem que por cá morreu, no esquecimento e na pobreza, mergulhado no tormento de não ter mãos.
Ao contrário, há quem assegure, como Camilo de Castelo Branco, que Duarte de Almeida viveu o resto dos seus dias em Vilharigues, relativamente confortável em resultado de uma herança que a sua mulher recebeu, que foi o Senhor da torre de Vilharigues, da casa da cavalaria de Vouzela e do reguengo de Lafões (supostamente doado à sua família como reconhecimento de diversos atos de bravura).
Seguindo esta linha de historiadores, Duarte de Almeida parece ter tido grande descendência juntamente com a esposa, D. Maria de Azevedo (filha do senhor da Lousã), e os seus filhos ocuparam cargos ou contraíram matrimónios de elevado prestigio.
Considerando alguns autores, Afonso Lopes de Almeida, seu filho primogénito, veio mesmo a dar origem à linhagem dos marqueses de Penalva.
Em Castela, Duarte de Almeida mereceu o respeito e a admiração de todos; até dos próprios reis, que mais tarde mandaram colocar a sua armadura na capela real da Catedral de Toledo, onde se encontra até hoje.
Em Portugal, a história e vida de Duarte de Almeida é pouco conhecida.
Conta-se, na localidade de Vilharigues, em jeito de lenda, que em certas noites ainda se ouvem os gemidos e lamentos de Duarte de Almeida vindos da torre de Vilharigues.
A vila de Vouzela homenageou Duarte de Almeida, parte da memória coletiva do concelho, dando o seu nome à Alameda dos Paços do Concelho, uma das praças mais importantes da vila.
Fotografia: "História de Portugal, popular e ilustrada. Vol.III".