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domingo, 25 de agosto de 2019

DA BOSTA ÀS VACAS VOADORAS

Um post de amigo numa Página vizinha, despertou-me o registo e fez-me recuar quase uma meia dúzia de décadas e transportar-me no comboio do tempo, à tela da minha infância, vivida, quase ininterruptamente, até aos 9/10 anos em ambiente rural, em região que, maioritariamente, fazia da actividade agrícola o seu modo de vida e o pão do seu sustento. Podia traçar-vos todos os cambiantes dum cenário campestre, enaltecer a mais valia da vida em comunhão com a Natureza, ainda não ferida de morte, na pujança vivificadora do ar que se respirava, da água cristalina que brotava em abundância das encostas verdejantes, também dos sacrifícios dos que dedicavam a vida ao amanho dos campos, mas é, tão só, duma prática a que assistia na aldeia onde me foi dada vida, que vos trago testemunho.
Por aquele tempo, ainda não haviam aqueles cacos velhos com que os "solidários" camaradas de Leste, limparam os seus excedentes de ferro velho, a seguir à "Revolução", muito menos, os comprados com os subsídios da CEE, pagos com as vinhas que se destruíram, com os barcos que se abateram, com o abandono dos campos. Eram os animais de tracção, puxados a feno e a aguilhada e a muitos berros, quem rasgava a terra, a preparava para as sementeiras e transportava as colheitas para os minguados celeiros. No fim do dia, por norma, já depois do sol se esconder pelas serranias fronteiriças, na rua principal da aldeia, onde tinha pouso e folguedos, era o regresso das vacas aos currais, atapetados a tojos e giestas, numa imagem que me sugere (sem generalizar) um desfile de "beldades" pelas artérias do Intendente alfacinha. Nesse trajecto, iam-se libertando, através do canal vizinho do enxota-moscas , dos despojos de pança cheia nos lameiros donde regressavam. Era, então, que via algumas das mulheres da aldeia, atarefadas nas lides caseiras, que complementavam os trabalhos dos seus homens, no campo, a recolherem os dejectos das "Cabanas", das "Mouriscas", das "Castanhas", para um recipiente. E, desengane-se quem pensar que havia nessa recolha um propósito sanitário de limpeza das ruas. Nada disso. Outro destino estava marcado para a "bosta" dos animais.
Conforme já se abordou por aqui, a broa de milho, era o pão mais consumido naqueles lugares e a cozedura em fornos rústicos, de tijolo e argila, com um chão granítico, aquecido com lenha do "molho" recolhido pelas matas e pinhais, onde, até por isso, os incêndios rareavam. A porta do forno, muito artesanal, nunca, no próprio dizer das padeiras caseiras, "estancava bem". Era aqui que a "bosta" recolhida da rua, exercia a sua função: depois da massa do pão introduzida no forno incandescente, qual argamassa ou betume, era disposta ao longo das frestas da porta, para impedir que o calor se libertasse. 
No fim, saíam as broas, rodas gigantes que eram o pão para quase toda a semana, por entre a bosta ressequida, já sem aquele aspecto lamacento e pouco atractivo, e, quanto ao cheiro, esse, já era só aquele agradável aroma do pão cozido....a pedir companhia duns nacos de presunto, a juntar à bola espalmada, de sardinha ou de chouriço ou toucinho que havia acompanhado as broas, na cozedura. E, a inevitável malga de morangueiro, a espumar tinta!....
Não ofereço. Já sei que ninguém é servido de pão que teve por vizinhança algo que terá eternamente o estigma de .......mavi! 
Mas, desengane-se quem pensar que aquele não era o pão de Deus. Que o que o diabo amassou, é o confeccionado na Padaria Nacional que vamos vivendo!.....
E, onde até as vacas já são voadoras!